Como tudo começou
O Atlético Mineiro foi fundado em uma reunião na arquibancada do Parque Municipal por um grupo de 22 garotos com média de idade de 13 anos. Liderados por Margival Mendes Leal, o Vate, em 25 de março de 1908, os meninos puderam formar, finalmente, o time de futebol. O clube realiza sua primeira partida a 21 de março de 1909 - uma vitória de 3 x 0 sobre o Sport Club Futebol. Em 1910 arranjaram um campo bom para treinar. Pertencera ao Sport e ficava na Avenida Paraopeba, onde hoje é o Minascentro. No dia 25 de março de 1913, passa a chamar-se Clube Atlético Mineiro. Somente em 1914 houve um torneio em Minas, a Taça Bueno Brandão que foi disputada entre Atlético, América e Yale. O Atlético fez dois jogos contra cada time e um com um combinado dos dois, ganhou 4, empatou uma partida, fez 8 gols e sofreu 1. O Clube também conquistou o primeiro título mineiro em 1915. Em 1923, o escudo redondo com as letras CAM inscritas foi trocado pelo escudo atual. Em 1929 o Clube Atlético Mineiro inaugura o estádio Presidente Antônio Carlos vencendo o Corinthians por 4 x 2.
Em 1937 o Atlético conquista o II Torneio Nacional de Clubes, superando os campeões de São Paulo (Portuguesa), do Espírito Santo (Rio Branco) e do Rio de Janeiro (Fluminense). Em 1950 realiza uma pioneira excursão pela Europa e seu sucesso - 10 jogos, 6 vitórias, 2 empates, 2 derrotas - rende-lhe o título de "Campeão do Gelo", que é citado no hino do clube. Em 1954 o Atlético realiza um sonho que havia sido frustrado 6 vezes. Conquista um tricampeonato mineiro, depois estendido até o pentacampeonato em 1956. Em 1969 o Atlético vence a seleção brasileira por 2 x 1 no Mineirão, gols de Dario e Amauri (Pelé descontou para o Brasil), convertendo-se no último clube de futebol do mundo a derrotar o Brasil.
Em 1971 o Atlético sagra-se campeão do primeiro campeonato brasileiro de futebol. Em meados da década revela a geração de craques - como Reinaldo e Toninho Cerezzo - que levariam o clube aos vice-campeonatos nacionais de 1977 e 1980, ao hexacampeonato mineiro de 1978-1983 e a uma série de conquistas em torneios da Europa. Na década de 1990 o Galo conquistaria por duas vezes a Copa Conmebol, em 1992 e 1997.
Antes da conquista do Brasileiro da Série B deste ano, o último título do Galo foi o Mineiro de 2000. Desde a posse de Ricardo Guimarães, em 2001, o time passava por uma maré de azar, tendo perdido todos os mineiros, e sendo eliminado por diversas "zebras" na Copa do Brasil (Brasiliense em 2001, Santo André em 2004, Ceará em 2005) e tendo passado o brasileiro de 2004 fugindo do rebaixamento. O time foi rebaixado em 2005, retornando a elite do futebol brasileiro com a conquista deste ano - feito este que acabou por eternizar a camisa 12 do clube - ninguém mais vai usá-la, pois pertence a sua torcida.
Curiosidades
O Atlético já ganhou vaga em sorteio. Foi nas quartas-de-final da Taça Brasil de 1967. Depois de ter perdido por 3 a 2 no Maracanã e vencido no Mineirão por 1 a 0, foi marcado um jogo desempate no mesmo Mineirão - só que ficaram no 0 a 0 no tempo normal e 1 a 1 na prorrogação. O jeito foi usar do "sorteio" para ver quem ficaria com a vaga. Deu Atlético.
O primeiro jogador a fazer gol pelo clube foi Anibal Machado, em 21 de março de 1909, na vitória de 3 x 0 sobre o Sport Club Futebol, que foi também a primeira partida do Galo.
A maior goleada do clássico entre Atletico e Cruzeiro (o maior das Minas Gerais) aconteceu em 27 de novembro de 1927. Galo 9 x 2 Raposa.
O Craque Reinaldo
Por doze anos, ele foi o soberano do Mineirão. Reinaldo ficou consagrado por sua genialidade, seus dribles desconcertantes e sua vocação para o gol. Conseguiu levar o Atlético-MG a sete títulos mineiros em oito anos (1976, 78, 79, 80, 81, 82 e 83), sendo artilheiro do time e do campeonato inúmeras vezes. Em 1977, Reinaldo estabeleceu um recorde que só foi batido 20 anos depois: o de artilheiro do Campeonato Brasileiro com 28 gols em apenas 25 partidas disputadas. Pelo Atlético-MG, o "Rei" - como era chamado pela massa atleticana - marcou 288 gols em 475 partidas. Reinaldo abandonou os campos em decorrência das contusões que o perseguiam, frutos da violência com que era marcado pelos adversários.
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quinta-feira, 26 de março de 2015
terça-feira, 29 de janeiro de 2008
Nossa História
Torcidas, as haverá mais numerosas (Flamengo) ou mais conhecidas por sua grandeza (Corinthians), mas nenhum séquito futebolístico brasileiro se compara ao do Clube Atlético Mineiro em mística apaixonada, em anedótario heróico, em poesia acumulada ao longo dos anos. "A Massa", como é simplesmente conhecida em Minas Gerais, compartilha com a torcida corinthiana ("A Fiel") a honra de deixar-se conhecer com um substantivo ou adjetivo comum transformado em nome próprio, inconfundível. A Fiel, A Massa: poucas outras torcidas terão realizado tal operação de mutação de um nome comum em nome próprio.
Muito distintas são, no entanto, as torcidas dos alvi-negros paulistano e belo-horizontino: quem já vestiu a camisa do time do Parque de São Jorge sabe que a Fiel é fiel em sua paixão, não em seu apoio. Na derrota, a Fiel é implacável; não desaparece, como a torcida do Cruzeiro. Está sempre lá. Mas é capaz de crucificar com um pequeno manifestar-se de sua raiva. Na vitória, cobra cada vez mais, e reinstala aí sua insatisfação, cuja raiz quiçá esteja no mal-resolvido trauma dos 23 anos sem título, e do grande pesadelo de duas décadas chamado Pelé. A Fiel é fiel, e sempre o foi, mas sua fidelidade se nutre de um descompasso entre a alma do torcedor e a alma do time.
No caso do atleticano, a alma do time não é senão a alma da torcida. Toda a mística da camisa, das vitórias sobre times técnicamente superiores (e também das derrotas trágicas e traumáticas), emana da épica, das legendárias histórias que nutre sua apaixonada torcida: nem o Urubu, nem o Porco, nem o Peixe, nem a Raposa, nem o Leão, nem nenhum animal mascote se confunde com o nome do time, com sua identidade, com sua alma mesma, como o Galo com o Atlético Mineiro. E Galo é o nome da torcida (GA-LO), bíssilabo cantável e entoável como grito de guerra que ela eternizou ao encarnar em si o espírito do animal. Nenhum outro time é conhecido por tantas vitórias improváveis só conquistadas porque a massa empurrou. "Quem possui uma torcida como esta, é praticamente impossível de ser derrotado em casa" (Telê Santana).
* Pelos idos de 69 ou 70, o timaço do Cruzeiro já tetra ou pentacampeão entrava em campo mais uma vez e parecia que de novo ia humilhar o Atlético, que já amargava o quinto aniversário do Mineirão sem nenhum título estadual. A superioridade técnica de Tostão, Dirceu Lopes, Natal, Raul, Piazza e cia. era simplesmente incontestável. Mesmo naquele clássico durante vacas tão magras, a massa atleticana era, como sempre foi, maioria no Mineirão. Impotente, ela viu Dirceu Lopes abrir o placar e o time do Cruzeiro massacrar o Galo durante 45 minutos. No intervalo, a massa que cantava o hino do Atlético foi inflamada por um recado de Dadá Maravilha pelo rádio: "Carro não anda sem combustível." A fanática multidão encheu-se de brios, fez barulho como nunca, entoou o grito de guerra como nunca, encurralou sonoramente a torcida cruzeirense, e o time do Atlético - infinitamente inferior, liderado pelo artilheiro Dario e pelo seu grande goleiro (como é da tradição atleticana) Mazurkiewcz - virou o placar para 2 x 1 sobre o escrete azul, e abriu caminho para a reconquista da hegemonia em Minas, selada com o título estadual de 70 e o Brasileiro de 71. Nenhum dos jogadores atleticanos presentes nessa vitória jamais se esqueceu da energia que emanava das arquibancadas, e que literalmente ganhou o jogo.
* Também as derrotas tradicionalmente contribuiram para a mística e paixão atleticana:
como em 1998, quando o visitante Corinthians trouxe ao Mineirão sua máquina que se preparava para ser bicampeã brasileira e campeã mundial. O Galo se recuperava no Campeonato Brasileiro, vinha de uma vitória sobre o Grêmio no Olímpico, e a Massa mais uma vez lotou o estádio. Com seu toque de bola, o Corinthians envolveu o time atleticano, e no meio do segundo tempo já aplicava impiedosos 5 x 0, enquanto tocava a bola, colocava os atleticanos na roda e esperava o fim do jogo. Vendo seu time humilhado por um adversário superior dentro de seu próprio terreiro, a massa se levantou, e cantou durante mais de 10 minutos o belo hino, mais alto e com mais amor que nunca. Nenhum jogador presente se esqueceu, e um ano depois o Galo devolveria ao Corinthians os 5 x 1 do Mineirão, com sonoros 4x0 no Maracanã.
como no silêncio sepulcral que envolveu o Mineirão em março de 1978, quando a grande equipe atleticana de Cerezzo, Reinaldo, Paulo Isidoro, João Leite e Marcelo perdeu nos pênaltis o título que todos já consideravam seu, incluindo-se, às vezes parece, os próprios adversários são-paulinos. O time do Atlético - mesmo jogando sem Reinaldo, injustamente suspenso - foi empurrado pela torcida, mostrou-se muito superior ao do São Paulo, como havia feito durante todo o campeonato em que acumulou 17 vitórias, 4 empates e nenhuma derrota, encurralou o adversário durante 120 minutos, mas o gol não saiu. O título é perdido nos pênaltis, mesmo depois de duas grandes defesas de João Leite em cobranças são-paulinas. Angelo, um dos craques do jovem time atleticano, deixa a partida pisoteado por Chicão, e nunca mais seria o mesmo. O Galo, base da seleção brasileira de Osvaldo Brandão, sai de campo vice-campeão invicto, com os 11 jogadores abraçados, 10 pontos à frente do campeão, e a Massa recebe aí sua grande tarefa dos próximos anos: realizar o luto pelo enorme trauma. Começou a tarefa no domingo seguinte às 10 da manhã, levando legiões de bandeiras para uma amarga partida contra o Bahia no Mineirão. Nenhuma outra derrota de um favorito no Brasileirão se revestiria de tanta mística apaixonada. A partir daí essa Massa acumularia 10 títulos mineiros em 12 anos, e uma sequência de campanhas sensacionais no Brasileirão (o Atlético Mineiro é o time que mais pontos conquistou nos Campeonatos Brasileiros), interrompidas na final ou semifinal, em jogos fatídicos (Flamengo-80, Santos-83, Coritiba-85, Guarani-86, Flamengo-87, Corinthians-88).
Galo Campeão do Gelo chega a BH (1950)
A magia atleticana se encarnaria no seu torcedor mais famoso, Sempre, cujo nome real não se conhece, tal é força do apelido. Durante décadas, Sempre ocupou as arquibancadas do Independência e do Mineirão, com sua bandeira e seus ditos legendários. Nunca deixou de comparecer e nunca vaiou o time, embora chorasse nas derrotas. Foi dos primeiros a entoar o hino composto por Vicente Motta em 1969, e depois aprendido por milhões em todo o Brasil. Abria e fechava o clube diariamente, e participou de epopéias memoráveis da massa atleticana, como quando a multidão carregou no colo o artilheiro Ubaldo, pentacampeão mineiro de 1956, de sunga, ao longo dos 5,5 kilômetros que separam o estádio Independência da Praça Sete, ou como quando 20.000 atleticanos invadiram o Maracanã e empurraram o time à conquista do Primeiro Campeonato Brasileiro, em 1971, sobre o Botafogo de Jairzinho.
O Furacão de 70 sentiu seu peso de novo cinco anos mais tarde, na decisão do Mineiro de 76 - quando a Massa, mesmo tendo comemorado só 1 dos últimos 11 campeonatos mineiros, tomou conta do Mineirão para empurrar uma turma de meninos de 18-21 anos (de nomes Reinaldo, Cerezzo, Paulo Isidoro, Danival, Marcelo) a vitórias contundentes sobre o campeão da Libertadores. Estava aberto o caminho para o hexacampeonato de 78-83.
"Se houver uma camisa alvi-negra pendurada no varal num dia de tempestade, o atleticano torce contra o vento." O achado do cronista Roberto Drummond resume a mitologia do Galo: contra fenômenos naturais, contra todas as possibilidades, contra forças maiores, a torcida atleticana passa por radical metamorfose e se supera. Superou-se tantas vezes que já não duvida de nada, e cada superação reforça ainda mais a mística, como uma bola de neve da paixão futebolística. Nenhum atleticano hesitaria em apostar na capacidade da Massa de transformar o impossível em possível a qualquer momento, de fazer parar aquela tempestade que açoita o pavilhão alvi-negro deixado solitário no varal.
Não surpreende, então, o sucesso que tiveram os jogadores uruguaios que atuaram no Atlético Mineiro, do grande Mazurkiewcz ao maior lateral-esquerdo da história do clube, Cincunegui. Se há uma mística de garra e amor à camisa que se compara à atleticana, é a da celeste, não mineira, mas uruguaia. Só à seleção uruguaia a pura paixão por um nome e um símbolo levou a tantas vitórias inacreditáveis, improváveis, espíritas, ou puramente heróicas. Em 1966, as duas camisas legendárias se encontraram, e o Galo derrotou o Uruguai duas vezes (26/04/66 - Atlético 3 x 2 Uruguai, 18/05/66 - Atlético 1 x 0 Uruguai).
Ao contrário das torcidas conhecidas por sua origem étnica (Palmeiras, Cruzeiro, Vasco), por sua origem social (Flamengo, Fluminense, Grêmio, São Paulo), ou por seu crescimento a partir de uma grande fase do time (Santos, Cruzeiro), qualquer menção da torcida do Atlético Mineiro evoca, invariavelmente, a substância mesma que constitui o torcer. O amor ao time na vitória e na derrota, o apoio incondicional, a garra, a crença de que sempre é possível virar um resultado, o hino entoado unissonamente: a legião fanática que ama o Galo acima de tudo sabe que ser atleticano é unir-se num estado de espírito, compartilhar uma memória, e fazer da esperança uma permanente iminência.
A massa atleticana é a prova maior de que, mesmo em época de profissionalização total do futebol, e do negócio futebol, para o povo brasileiro este é acima de tudo paixão por uma cor, um nome, um símbolo, a memória de um instante que pode ser um gol, um campeonato, um abraço ou um beijo. Galo é o nome que mais radical e verdadeiramente expressa, para tantos milhões de brasileiros, o inexplicável dessa paixão.
03-09- 1969
Atlético 2 x 1 Brasil
O Galo é o único clube a ter vencido a Seleção Brasileira. E não foi qualquer uma. Ela entrou em campo com Felix, Carlos Alberto, Djalma Dias, Joel e Rildo (Everaldo); Piazza e Gérson (Rivelino); Jairzinho, Tostão (Zé Maria), Pelé e Edu (Paulo César). O Galo venceu com Mussula, Humberto Monteiro, Grapete, Normandes (Zé Horta) e Cincunegui (Vantuir); Oldair e Amauri (Beto); Vaguinho, Laci, Dario e Tião (Caldeira).
O Galo no Ranking Brasileiro e Mundial
Seleção
Kafunga (João Leite
Taffarel ou Mazurkiewcz)
Mexicano (ou Nelinho)
Murilo (ou Osmar Guarnelli)
Luisinho (ou Oldair)
Cincunegui (ou Paulo Roberto) (ou Jorge Valença)
Zé do Monte (ou Haroldo)
Cerezzo (ou Guará)
Carlyle (ou Paulo Isidoro)
Lucas (ou Mário de Castro)
Reinaldo (ou Dadá Maravilha)
Éder Aleixo (ou Ubaldo)
Websites do Galo
Atlético Mineiro - Página Oficial
Crônicas:
A Mística da Massa Atleticana, Galoucura
O Campeão Mineiro de 1999, por Leonardo Bertozzi.
O Nascimento da Tiago Galo, por Tiago Lemos Gontijo.
Música:
Hino do Galo (versão acústica), por Wilson Sideral
Hino do Galo (versão rock), João Penca e seus Miquinhos Amestrados
Citações:
" Nós somos do Clube Atlético Mineiro, jogamos com muita raça e amor..." O hino do
Atlético, escrito em 69 por Vicente Mota, é o hino de time mais cantado no mundo inteiro. Não há um atleticano que não o saiba de cor e mesmo certos rivais sabem cantar o Hino do Galo inteiro, mas não sabem nem a primeira estrofe do hino de seus próprios times. Não há emoção maior do que ver o Mineirão lotado balançando ao som do Hino Atleticano, uma mágica inexplicável que imediatamente transforma os jogadores alvinegros em campo e faz tremer o inimigo.
Campeão dos Campeões (1937)
O trio maldito
O 1º campeão brasileiro
O time dos sonhos
Culturas Gerais
Resumindo um Atleticano
ORAÇÃO DO ATLETICANO
Por Roberto Drummond
Senhor:
apague o sol
apague a lua
anoiteça os olhos da amada
mas não deixe o Atlético capitular
não deixe, Senhor, o adversário passar
não deixe nosso goleiro vacilar.
Dê asas de pássaros ao goleiro
dê os braços dos amantes
ao goleiro
faça-o abraçar esse pássaro
sem asas
como se fosse a mulher mais esperada
mais desejada
mais sonhada
mais amada
mais adiada.
Senhor:
tire o pão nosso de cada dia
corte nossa água
nos condene à fome e à sede
proíba nossos amores
exile as amadas na China
ou na Conchinchina
decrete a solidão
nas esquinas, nos bares e
em nosso coração
faça de nós, Senhor,
um bolero
faça de nós um tango
faça de nós uma guarânia
ou uma balada
faça de nós a mais desesperada canção
nos mate não apenas da sede de água
mas da sede
da boca da amada
mas transforme nossa defesa
num muro
numa barreira
numa trincheira
num obstáculo intransponível.
Mate a todos nós
da fome de amor
que é pior que a fome de verdade
mas não deixe, Senhor,
o adversário passar.
Senhor:
dispare a inflação
mingüe nosso feijão
aprisione nossa ilusão
prenda de vez nosso coração
mas espalhe luz
sobre os caminhos do Atlético
sobre a grama verde onde pisam
nossos heróis.
Acenda uma estrela na chuteira deles
e não deixe, Senhor, o adversário passar.
Não deixe o Atlético capitular.
Senhor:
nos faça descobrir o amor
para depois tirá-lo de nós.
Faça-nos sofrer de amor
mate-nos de amor, se preciso
mas quando nosso atacante pegar a bola,
Senhor,
iluminado seja o seu caminho
cheio de estrelas e de dribles
e de passes mágicos e de cruzamentos
e de gols
seja feito o seu caminho
encantada seja sua chuteira
e que nos seus pés
na sua cabeça
bendita seja a vitória do Atlético.
E depois de tudo, Senhor,
depois que o Atlético cantar
aí, Senhor, se julgar necessário
nos tomar algum fruto
após tanta recompensa,
prive-nos de tudo que quiser
exile a amada no Equador
e, outra vez, Senhor
nos mate de amor,
mas não deixe o adversário passar.
Cássia Eller
CASSIA ELLER, GAROTINHA ATLETICANA
Quando o Campeonato Brasileiro começou a ser disputado, em 1971 – até então, a competição tivera vários nomes diferentes – a rivalidade entre os clubes era imensa. Havia pelo menos dez ou doze times que entravam no torneio para disputar a taça, sem essa preocupação tola e tão atual de “lutar para não cair”. Um dos mais fortes postulantes ao título sempre foi o Clube Atlético Mineiro. No primeiro Brasileirão, o Galo já era um time imponente. Havia conquistado 23 vezes o campeonato estadual de Minas Gerais (18 vezes como profissional e outras cinco, entre 1915 e 1932, como clube amador).
Seu histórico de glórias o havia transformado no clube mais popular do Estado. Contava com uma torcida apaixonada, exigente, acostumada a vitórias. Entre torcedores ilustres e anônimos, uma menininha acanhada de 8 para 9 anos testemunhou das arquibancadas do então novíssimo estádio do Mineirão a arrancada do Atlético rumo ao título de primeiro Campeão Brasileiro. Seu nome: Cássia Eller.
Nascida no Rio, Cássia herdou dos pais, mineiros, a paixão pelo Atlético. Quando foi morar no bairro de São Francisco, em Belo Horizonte, pertinho do Mineirão, passou a freqüentar o estádio na companhia do pai. Tímida incorrigível, no meio da massa Cássia se transformava em torcedora fanática. Uma de suas diversões favoritas sempre foi engrossar o coro da torcida atleticana contra o goleiro Raul Plasmann, do arqui-rival Cruzeiro. Primeiro arqueiro do país a envergar camisas coloridas no lugar do então tradicional uniforme preto, bastava Raul pisar o gramado para ouvir a torcida adversária “homenageá-lo” aos gritos de “Wanderléa!”.
Mas prazer mesmo Cássia teve ao ver a campanha memorável de 1971. Numa época em que o futebol brasileiro ainda não havia se rendido à retranca, o esquadrão formado por Renato; Humberto Monteiro, Grapete, Vantuir e Oldair; Vanderlei e Humberto Ramos; Ronaldo, Dario, Lola e Tião, era um autêntico 4-2-4 (que hoje seria modernamente chamado de 4-2-2-2). Sob o comando de um circunspecto senhor, chamado pelo grupo de “mestre” Telê Santana, aquele time venceu um a um seus adversários. O certame foi fechado com chave de ouro, na vitória por 1x0 sobre o Botafogo, gol de Dario, em pleno Maracanã.
O Galo entrou para história fazendo barba e cabelo: ergueu a taça de primeiro campeão brasileiro e ainda ostentou o artilheiro da competição, Dadá Maravilha, com 15 gols. O centroavante beija-flor ainda repetiria o feito no ano seguinte. Ele e o uruguaio Pedro Rocha, estrela do São Paulo, dividiram a artilharia de 1972 com 17 gols cada.
No ano seguinte ao inesquecível triunfo atleticano, Cássia afastou-se de Belo Horizonte. Foi morar em Santarém, depois no Rio, Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro novamente, onde finalmente despontou para o estrelato. Mas aquele time a marcou para sempre. Em seu guarda-roupas, havia sempre uma camisa do Atlético.
Depois da morte da cantora, em dezembro de 2001, foi a vez do Atlético retribuir o imenso carinho que aquela torcedora especial tinha para com o time. Na tarde de sábado, 16 de março de 2002, Atlético e América se enfrentaram no estádio Independência, em Belo Horizonte, pela Copa Sul-Minas. Os 16.807 pagantes viram o Galo vencer o Coelho de virada por 4 a 3. No intervalo da partida, a diretoria do Atlético chamou ao centro do gramado a torcedora Nanci Ribeiro, mãe de Cássia. Entregou a ela a escultura de um galo de prata como os dizeres: “Cássia Eller, como o nosso time, é imortal”.
As lágrimas que correram pelo rosto da orgulhosa mamãe mal deixaram que ela visse as bandas Jota Quest, Terral e Tianastácia, além dos cantores Wilson Sideral, Kênia Aguiar, Celso Adolfo e Cid Ornelas cantarem em homenagem a sua filha. Mas Nanci se arrepiou para valer, mesmo, quando as torcidas adversárias do Galo e do Coelho deixaram a rivalidade de lado e se uniram num coro de 17 mil vozes para cantar “Malandragem”, música que marcou a carreira de Cássia. Um golaço!
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Eduardo Belo e Ana Cláudia Landi são jornalistas e autores de "Apenas uma Garotinha – A História de Cássia Eller" [Editora Planeta]